O peso deste anúncio reside no fato de estar respaldado pelo Comitê Estratégico do Futebol Europeu, que envolve representantes das Ligas (EPFL), clubes (ECA), federações (Uefa) e jogadores (FIFPro), ou seja, em tese transparece uma iniciativa louvável de tornar o futebol um produto atraente para investidores sérios, ao investir em políticas austeras e transparentes para o futebol.
Dentro dessa estrutura do conceito do fair play financeiro, a Uefa criou o Painel do Controle Financeiro dos Clubes, composto por um grupo de especialistas em leis e finanças no intuito de auditar os clubes europeus para auxiliá-los no cumprimento de um fundamento básico, eu diria até primitivo em economia básica: os clubes não devem gastar mais do que geram de receita.
Entre os objetivos desse Comitê, destacam-se: os clubes não poderão gastar repetidamente mais do que as receitas geradas; serão criadas normas sobre os gastos em salários e transferências, bem como indicadores da sustentabilidade dos níveis de dívida e os clubes serão obrigados a honrarem sempre os seus compromissos.
O conceito é sensacional em termos de progresso para que o futebol se torne um produto ainda mais atraente aos investidores, e poderíamos ficar animados com as possibilidades que essas propostas criariam para o esporte, inclusive caso internacionalizem essas medidas para alcançar, por exemplo, o futebol brasileiro, mas cabe cautela na análise do suposto reordenamento do futebol mundial.
Um exemplo é a criação, desta vez pela Fifa, do Transfer Matching System, onde os clubes e federações teriam um mecanismo de transparência para as transferências de jogadores, além de agilizar a emissão do certificado de transferência internacional no modo online. Os dados seriam facilmente checados na origem da transferência e no seu destino, e terminaria com os pagamentos ilegais e a lavagem de dinheiro que pode ser efetuada através das transferências de jogadores. O mais importante, contudo, não fica claro: existirá uma fiscalização mais dura na declaração de renda dos atores envolvidos nesse tipo de negócio? Quem regulará se os dados fornecidos ao sistema correspondem com a realidade do negócio?
Outro exemplo é tanto a política denominada “6+5” do presidente da Fifa Joseph Blatter, quanto à 'Homegrown Players Rule' introduzida pela Uefa, ou até mesmo a iniciativa da Federação Inglesa em implementar cotas para jogadores formados nas divisões de base da Inglaterra e País de Gales, nos clubes locais. As regras têm peculiares diferenças (principalmente a inglesa, que é flexível na definição do jogador formado na Inglaterra, não exigindo a nacionalidade inglesa a esses jovens jogadores), mas no bojo têm o mesmo sentido geral: preservar as raízes nacionais do futebol praticado em cada país europeu, fortalecendo assim as suas identidades, representadas nas seleções nacionais.
Porém, vai de encontro ao processo cada vez mais evidente do fortalecimento do futebol como produto de uma atividade econômica forte, a ser vendida para o mundo todo via licenciamento de marcas, venda de camisas, direitos de transmissão televisiva, dentre outras iniciativas que cada dia se tornam requisitos para o progresso financeiro dos clubes.
Ou seja, de um lado do cabo de guerra, encontram-se os detentores do negócio envolvendo seleções nacionais e seus respectivos torneios, com medidas para fortalecer seus produtos (Copa do Mundo, Eurocopa, Copa das Confederações) através de cotas para jogadores nacionais nas Ligas de seus países. Na outra ponta, os grandes clubes europeus, sedentos por novos mercados e maior mercado consumidor, tendo nas políticas de cotas anunciadas pela Fifa e pela Uefa como inibidores do processo de internacionalização de suas marcas, através de um projeto de Superliga Europeia. Aguardemos o resultado dessa disputa, que será decisiva para demarcar o futuro do futebol profissional mundial nos próximos anos.
Fonte:trivela.com